Globo, RBS e Estado de SC condenados a indenizar inocente exibido como "maníaco sexual"
(25.02.11)
O Estado de Santa Catarina, a TV Globo e a RBS Zero Hora Editora Jornalística S.A. foram condenadas ao pagamento de uma indenização de R$ 270 mil, por danos morais a A. P. Ele é jardineiro autônomo, casado, e por longos anos foi funcionário de uma empresa catarinense. Na época dos fatos tinha 30 anos de idade.
Um retrato falado baseado em suas feições foi apresentado nesses meios de comunicação, com base em informações fornecidas pela polícia civil, como o do principal suspeito de ser o criminoso apelidado “maníaco da bicicleta”, que aterrorizou e estuprou mulheres em Joinville (SC). A ação tramita desde 27 de dezembro de 2000 - portanto há mais de dez anos - uma demora espantosa.
Durante muito tempo, o homem teve dificuldades de trabalhar e se manter.
O Estado foi condenado a pagar R$ 60 mil; a TV Globo, R$ 180 mil; e a RBS, R$ 30 mil. Segundo os autos, no dia 30 de outubro de 2000, A.P. foi intimado a comparecer na delegacia de polícia para ser confrontado às vítimas do “maníaco da bicicleta”.
Nesse dia da acareação, nenhuma das vítimas o reconheceu como o criminoso. Ele foi liberado em seguida. Alguns dias depois, o retrato falado do suposto criminoso foi divulgado pelo programa Fantástico, da Rede Globo, e nas páginas do jornal A Notícia. O retrato fora repassado à imprensa pela polícia civil.
Durante a demorada tramitação da ação, ficou definitivamente comprovado que a vítima do ilícito civil não era efetivamente o "maníaco". Ao lesado foi, então, em antecipação de tutela, estipulada indenização provisória por abalo moral em R$ 60.000,00 - a ser paga igualitariamente pela Globo e pela RBS Zero Hora Editora.
Na mesma decisão foi determinado o pagamento de uma prestação pecuniária mensal em favor do autor, no valor de R$ 600,00 (cada um dos três réus deveria pagar uma terça parte), porquanto "reconhecido o nexo causal entre o ato de divulgação do retrato-falado forjado e o dano decorrente disso (dificuldade em integrar-se ao mercado de trabalho)".
Mas as duas empresas agravaram ao TJ catarinense, que proveu os recursos para suspender os pagamentos.
Na sentença, publicada ontem (24) - dez anos e dois meses depois do ajuizamento da ação - o juiz Roberto Lepper, da 1ª Vara da Fazenda da comarca de Joinville, afirmou que "o retrato falado repassado à imprensa foi forjado pela polícia civil, que também encaminhou a imagem a outras forças de segurança do Estado". O juiz entendeu ainda, que "os meios de comunicação divulgaram algo inverídico, sem antes realizar um juízo crítico sobre o que foi repassado pela polícia".
O julgado é candente: "a foto de A. foi propositalmente manipulada para servir de referência ao que seria a imagem do rosto do estuprador contumaz. A manobra de manipulação foi grosseira: o contorno dos olhos, o chumaço de cabelo sobressalente por detrás da orelha e a corrente pendurada no pescoço são detalhes que, presentes em ambas as imagens (a original e o "retrato-falado"), arredam qualquer dúvida sobre a forja da figura".
Para o magistrado, o Estado e o aparato policial realizaram "manobra tendente a aplacar a ansiedade social no sentido de encontrar-se aquele que estava barbarizando nas ruas da cidade".
Por fim, o juiz avalia a extensão do drama. “A chaga provocada na psique do autor tenderá a sangrar por muito tempo, até porque ninguém consegue esquecer facilmente algo tão avassalador como o que enfrentou A. - nem sei se alguém realmente consegue digerir, ao longo da vida, trauma dessa envergadura”.
Ainda não há trânsito em julgado. A condenação da RBS Zero Hora Editora se dá na condição de sucessora de A Notícia S/A Empresa Jornalística.
O advogado Elemar Buettgen atua em nome do autor da ação. (Proc. nº 03800061710-2 - com informações do TJ-SC e da redação do Espaço Vital).
Leia aqui mesmo a parte dispositiva da sentença
"Procedência parcial do pedido
À luz do exposto, JULGO PROCEDENTE, em parte, o pedido veiculado nesta AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS e MATERIAIS proposta por A.P. contra ESTADO DE SANTA CATARINA, TV GLOBO LTDA e RBS ZERO HORA EDITORA JORNALÍSTICA S/A (sucessora de A NOTÍCIA S/A EMPRESA JORNALÍSTICA), para condenar:
a) o Estado de Santa Catarina no pagamento, em favor do autor, do valor de R$ 60.000,00, a título de indenização por danos morais, cujo montante deverá ser atualizado a partir desta data e acrescido de juros moratórios, estes a partir da data do ato ilícito, que, na falta de informação mais precisa, reconheço como sendo o da primeira divulgação do "retrato-falado" pela imprensa (em 05.11.2000 fl. 4) (STJ Súmula n 54).
b) a TV Globo Ltda no pagamento, também em prol do autor, do valor de R$ 180.000,00, referente à indenização por danos morais, acrescido de juros desde a data da divulgação da matéria no Fantástico (05.11.2000). Esse valor também deverá ser corrigido desde a data da publicação dessa sentença (STJ Súmula n 362);
c) a RBS Zero Hora Editora Jornalística S/A a pagar ao autor o valor de R$ 30.000,00, sob o mesmo título, cujo montante deverá ser acrescido de juros legais desde a publicação da matéria jornalística reputada lesiva (07.11.2000 fl. 45).
O montante também deverá ser atualizado da data de publicação dessa sentença.
Revogo a decisão interlocutória de fls. 402/418, devendo proceder-se à compensação consoante determinado na fundamentação desta sentença.
Como o autor decaiu de parte considerável do pedido (lucros cessantes), condeno-o no pagamento de das despesas processuais, bem como no pagamento de honorários advocatícios devidos aos procuradores dos três réus, no importe de R$ 2.000,00 em prol de cada um dos acionados (CPC, art. 20, 4), atualizado desta data. O restante das despesas deverá ser repartido, proporcionalmente, entre os três demandados, mas
As rés TV Globo Ltda e RBS Zero Hora Editora Jornalística deverão arcar com honorários advocatícios em favor do procurador do autor, estes fixados em 15% sobre os valores das condenações (atualizadas) respectivamente impostas a cada uma das prefaladas litisconsortes (art. 20, 3).
Em relação à Fazenda Pública, os honorários deverão incidir à ordem de 10% sobre o valor atualizado da condenação (TJSC Apelação Cível n 2003.029819-3, de Santo Amaro da Imperatriz, Primeira Câmara de Direito Público, rel. Des. NICANOR DA SILVEIRA, julgada em 24.11.2005; Apelação Cível n 2011.001185-6, da Capital, Primeira Câmara de Direito Público, unânime, rel. Des. VANDERLEI ROMER, j. em 15.02.2011, entre outros).
A contagem das custas deve dar-se na forma da lei. Recorro, de ofício, desta sentença (CPC, art. 475, inc. I). Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Joinville, 24 de fevereiro de 2011.
ROBERTO LEPPER - juiz especial, em exercício".
Fonte :www.espacovital.com.br
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